O novo Decreto nº 12.189/2024 impôs penalidades severas aos produtores rurais. Conheça os detalhes dos artigos 58, 58-A, 58-B e 58-C, e veja como se proteger de multas milionárias por queimadas e omissões. Exemplos práticos ilustram como se adequar a essa nova realidade.
O Decreto nº 12.189/2024, que altera o Decreto nº 6.514/2008, trouxe profundas mudanças nas sanções ambientais, especialmente em relação ao uso do fogo e à prevenção de incêndios florestais. Para os produtores rurais, essas mudanças elevam o nível de responsabilidade e de preparo exigido para manter suas propriedades em conformidade com a lei. Vamos explorar as mudanças trazidas pelos artigos 58, 58-A, 58-B e 58-C, que são essenciais para quem lida com áreas de cultivo, floresta nativa e manejo florestal.
Art. 58 – Multa por Queimada Não Autorizada
O artigo 58 foi mantido em sua essência, prevendo multa de R$ 3.000,00 por hectare ou fração para quem realizar queimadas em áreas fora da autorização legal. Essa regra tem impacto direto em pequenos e médios produtores que, por tradição, utilizam o fogo para limpeza de pastagens ou de áreas de cultivo.
Exemplo prático:
Imagine que um produtor realiza uma queimada para preparar o solo para a próxima safra, sem a devida autorização do órgão ambiental. O fogo, inicialmente controlado, atinge uma área de 10 hectares, que não estava legalmente autorizada para tal prática. Nesse caso, o produtor estará sujeito a uma multa de R$ 30.000,00, correspondente aos 10 hectares atingidos. Esse exemplo mostra como é crucial obter as licenças antes de qualquer queimada.
Art. 58-A – Incêndio em Floresta Nativa
Uma das mudanças mais drásticas diz respeito ao art. 58-A, que impõe multa de R$ 10.000,00 por hectare para quem provocar incêndio em floresta ou qualquer forma de vegetação nativa. Essa sanção é particularmente severa, visando coibir práticas que possam destruir áreas de preservação ou causar danos irreversíveis ao ecossistema.
Exemplo prático:
Um produtor tem uma área de 5 hectares de floresta nativa dentro de sua propriedade. Durante uma temporada de seca, ele decide usar fogo para eliminar o sub-bosque, sem perceber o risco envolvido. O fogo se espalha e atinge toda a área de vegetação nativa. Neste caso, a multa será de R$ 50.000,00 pelos 5 hectares atingidos. Além de enfrentar a sanção financeira, o produtor também poderá ser responsabilizado por eventuais crimes ambientais.
Art. 58-B – Incêndio em Floresta Cultivada
Já o art. 58-B prevê multa de R$ 5.000,00 por hectare ou fração em casos de incêndio em florestas cultivadas, como áreas de reflorestamento ou exploração madeireira. Essa penalidade visa proteger a sustentabilidade das atividades florestais, evitando que incêndios destruam cultivos planejados para exploração econômica.
Exemplo prático:
Um empresário do setor madeireiro possui uma área de reflorestamento de eucaliptos. Durante a colheita, um incêndio acidental provocado por uma faísca se alastra e destrói 20 hectares da floresta cultivada. Nesse caso, a multa aplicada será de R$ 100.000,00, levando em consideração o valor por hectare estipulado no decreto. Este exemplo demonstra a necessidade de cautela e preparação, mesmo em áreas destinadas à exploração econômica.
Art. 58-C – Ações de Prevenção e Combate a Incêndios
O art. 58-C introduz uma responsabilidade ainda maior para o produtor rural, ao exigir que ele implemente ações de prevenção e combate a incêndios florestais de acordo com as diretrizes do Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo e órgãos do Sisnama. A multa por descumprimento pode variar entre R$ 5.000,00 e R$ 10.000.000,00.
Esse artigo não se refere ao fato de causar diretamente o incêndio, mas sim à omissão em implementar ações preventivas. Mesmo que o fogo seja iniciado por terceiros, o proprietário pode ser multado se não houver adotado as medidas necessárias para prevenir a propagação do incêndio.
Exemplo prático:
Imagine que um fazendeiro tenha 300 hectares de terras. Um incêndio começa em uma propriedade vizinha e se espalha para suas terras. As autoridades ambientais verificam que o fazendeiro não tinha aceiros, brigada de incêndio, ou qualquer plano de prevenção aprovado pelos órgãos competentes. Mesmo sem ser o causador do incêndio, ele poderá ser multado em valores que podem chegar a R$ 1.000.000,00, devido à ausência de medidas preventivas.
Esse artigo traz um peso considerável sobre os ombros dos produtores rurais, especialmente quando se leva em conta a morosidade dos órgãos licenciadores, que muitas vezes atrasam a concessão de autorizações ou demoram para aprovar os planos de manejo. Produtores frequentemente enfrentam um impasse: por um lado, têm a necessidade de realizar queimadas controladas, e, por outro, encontram dificuldade em obter a devida autorização. A cautela excessiva dos órgãos, justificada pela proteção ao meio ambiente, pode resultar em prejuízos ao produtor, que, sem autorização, fica exposto a multas severas caso precise agir em situações de emergência.
Implicações do Julgado do TJSP e o Agravamento das Sanções com o Decreto nº 12.189/2024: Um Estudo Comparativo
Além da aplicação prática do artigo 58 para infrações por queimadas não autorizadas, cabe destacar a jurisprudência recente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que reforça a aplicação rigorosa dessas sanções ambientais. No caso TJSP – AC 1001448-82.2022.8.26.0369, relatado pelo Desembargador Marcelo Berthe, com decisão publicada em 14 de fevereiro de 2024, o tribunal manteve a multa aplicada a um particular que utilizou fogo em área agropastoril sem a devida autorização, resultando em danos à vegetação nativa. A decisão sublinhou a inexistência de ilegalidade no ato administrativo, reconhecendo que os aceiros ineficazes facilitaram a propagação do fogo e os carreadores sujos impediram o combate adequado ao incêndio.
Naquele momento, as sanções estavam previstas no Decreto nº 6.514/2008, com multas aplicadas de acordo com o antigo art. 58. A autoridade ambiental pôde enquadrar o infrator corretamente e aplicar a penalidade de forma válida. Contudo, se a mesma conduta ocorresse sob a vigência do novo Decreto nº 12.189/2024, as penalidades poderiam ser ainda mais severas, especialmente com a introdução dos novos artigos 58-A, 58-B e 58-C, que aumentam consideravelmente as responsabilidades dos produtores rurais.
Por exemplo, sob o novo regime:
- O uso de fogo que resulta em danos à vegetação nativa agora estaria sujeito a uma multa de R$ 10.000,00 por hectare ou fração conforme o art. 58-A.
- Incêndios em florestas cultivadas também são punidos com uma multa de R$ 5.000,00 por hectare ou fração, de acordo com o art. 58-B.
- O art. 58-C introduz uma nova obrigação para que o proprietário rural implemente ações preventivas contra incêndios, sob pena de multas que podem variar entre R$ 5.000,00 a R$ 10.000.000,00, mesmo que o incêndio seja causado por terceiros, caso o proprietário tenha negligenciado essas ações.
Além disso, um outro julgado recente do Tribunal de Justiça de São Paulo, TJSP – AC 1051242-55.2019.8.26.0053, relatado pelo Desembargador Marcelo Berthe e publicado em 11 de outubro de 2023, reforça a aplicação de multas e sanções ambientais em casos de uso de fogo em áreas agropastoris sem autorização. Nesse julgamento, a decisão destacou a insuficiência dos aceiros e dos carreadores sujos, contribuindo para a propagação do fogo.
Sob a vigência do Decreto nº 12.189, de 20 de setembro de 2024, a situação descrita no julgamento poderia ser ainda mais severa, com a aplicação de penalidades adicionais previstas nos artigos 58-A, 58-B e 58-C, além da multa já aplicada conforme o art. 58. O reforço das responsabilidades do proprietário por omissões nas medidas de prevenção, bem como o aumento das multas em casos de danos à vegetação nativa ou florestas cultivadas, é uma mudança significativa no tratamento legal das infrações ambientais.
Portanto, no atual cenário regulatório, as condutas destacadas nos julgados em comento poderiam resultar em multas significativamente maiores com acaso o infrator também tivesse falhado em implementar medidas preventivas adequadas, conforme exigido pelo Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo. O novo Decreto nº 12.189, de 20 de setembro de 2024, amplia a responsabilização e impõe sanções mais duras, elevando o nível de preparo exigido dos proprietários rurais para garantir o cumprimento das normas ambientais.
Conclusão
O Decreto nº 12.189/2024 aumentou significativamente a responsabilidade dos proprietários rurais em relação à gestão de suas terras e à prevenção de incêndios. Para evitar sanções graves, é crucial que os produtores adotem medidas de prevenção, mantenham suas propriedades regularizadas e estejam atentos aos prazos e exigências dos órgãos ambientais.
As multas previstas nos artigos 58, 58-A, 58-B e 58-C têm um impacto considerável, podendo variar de alguns milhares a milhões de reais. A orientação é clara: os proprietários devem investir em sistemas de prevenção e controle de incêndios, mesmo que enfrentem a inércia dos órgãos licenciadores. A precaução é o melhor caminho para evitar conflitos com a legislação e garantir a continuidade das atividades econômicas rurais.
Flávio Monteiro Napoleão
Advogado OAB/PI 9.068
Referências
•Tribunal de Justiça de São Paulo, Recurso de Apelação em Ação de Procedimento Comum – Meio Ambiente. TJSP – AC 1001448-82.2022.8.26.0369, Relator: Marcelo Berthe, Comarca de Monte Aprazível, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Data de Julgamento: 14 de fevereiro de 2024, Data de Publicação: Diário de Justiça Eletrônico (DJe), 14 de fevereiro de 2024.
•Tribunal de Justiça de São Paulo, Recurso de Apelação em Ação de Procedimento Comum – Meio Ambiente. TJSP – AC 1051242-55.2019.8.26.0053, Relator: Marcelo Berthe, Comarca de São Paulo, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Data de Julgamento: 11 de outubro de 2023, Data de Publicação: Diário de Justiça Eletrônico (DJe), 11 de outubro de 2023.
•Brasil. Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. Dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 jul. 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/Decreto/D6514.htm. Acesso em: 25/09/2024.
• Brasil. Decreto nº 12.189, de 20 de setembro de 2024. Altera o Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 set. 2024. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/decreto/D12189.htm. Acesso em: 25/09/2024.