Alterações no Art. 20 do Decreto nº 12.189/2024: Novas Regras para Sanções Restritivas de Direito e Seus Impactos

As mudanças no Art. 20 do Decreto nº 12.189/2024 ampliam os prazos e as condições para a aplicação de sanções restritivas de direito, trazendo maior rigor para as infrações ambientais. Entenda o que mudou e como isso afeta a regularização de atividades econômicas.

O Decreto nº 12.189/2024, que alterou diversos dispositivos do Decreto nº 6.514/2008, trouxe mudanças significativas na aplicação de sanções restritivas de direito, especialmente em relação ao art. 20. A nova redação amplia os prazos máximos de suspensão e cancelamento de licenças, autorizações e registros, tornando o regime punitivo ainda mais rigoroso para aqueles que cometem infrações ambientais.

Neste artigo, analisaremos detalhadamente as modificações feitas no art. 20, comparando a redação antiga com a nova e explicando os impactos práticos para os produtores rurais, empresas e outros que lidam com atividades sujeitas a licenciamento ambiental.

Redação Antiga do Art. 20

Antes das alterações, o art. 20 do Decreto nº 6.514/2008 previa as seguintes sanções restritivas de direito para pessoas físicas ou jurídicas envolvidas em infrações ambientais:

1.Suspensão de registro, licença, permissão ou autorização;

2.Cancelamento de registro, licença, permissão ou autorização;

3.Perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais;

4.Perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;

5.Proibição de contratar com a administração pública.

Além disso, o parágrafo único do dispositivo estabelecia que a autoridade ambiental determinaria o período de vigência da sanção, com o limite máximo de três anos.

Nova Redação do Art. 20 (Decreto nº 12.189/2024)

Com o Decreto nº 12.189/2024, a nova redação do art. 20 introduziu prazos mais longos para a aplicação de sanções restritivas de direito, além de prever a possibilidade de revisão dessas sanções em casos de regularização. As sanções agora têm prazos máximos de cinco a dez anos, dependendo da infração cometida.

A nova redação do § 2º especifica:

Até cinco anos para a sanção de proibição de contratar com a administração pública (inciso V);

Até dez anos para as demais sanções, incluindo a suspensão ou cancelamento de registros, licenças e autorizações.

Além disso, o § 3º introduz uma novidade importante: a possibilidade de revisão do período de aplicação da sanção restritiva de direito, caso o infrator regularize sua conduta durante o processo administrativo. Essa mudança visa incentivar a conformidade ambiental, oferecendo ao infrator uma oportunidade de reduzir o tempo de penalização ao corrigir as irregularidades detectadas.

Impactos Práticos das Novas Regras

1. Prazos Mais Longos: Aumento do Rigor nas Penalidades

A principal alteração é a extensão dos prazos de sanção. Na prática, isso significa que, dependendo da gravidade da infração, o infrator pode ter suas atividades suspensas por até dez anos. Esse aumento no prazo representa uma medida de maior severidade, principalmente para grandes empresas ou produtores que dependem de licenças ambientais para manter suas operações.

Exemplo prático:

Uma empresa de mineração que comete infrações ambientais graves, como o descumprimento de condicionantes de licenciamento, pode ter sua licença suspensa por até dez anos, interrompendo suas operações e causando grandes prejuízos econômicos.

2. Revisão de Sanções: Incentivo à Regularização

Por outro lado, a inclusão do § 3º traz uma possibilidade positiva para os infratores: a revisão do prazo da sanção caso a conduta irregular seja corrigida. Isso incentiva as empresas e produtores a regularizarem rapidamente suas atividades para evitar a paralisação prolongada.

Exemplo prático:

Um produtor rural que tenha sua licença suspensa por uso inadequado de agrotóxicos pode solicitar a revisão da sanção se, durante o processo administrativo, ele demonstrar que adotou práticas sustentáveis e regularizou sua situação. Com isso, a sanção, que poderia durar até dez anos, pode ser reduzida para um período menor.

3. Efeito Disciplinador para o Setor Econômico

A extensão dos prazos de sanção e o aumento da gravidade das consequências para infrações ambientais buscam criar um efeito dissuasivo. A imposição de uma suspensão de licenças por até dez anos pode significar, na prática, o fim de determinadas atividades econômicas, caso as empresas não tenham condições financeiras de aguardar o prazo para retomar suas operações.

A nova regra também afeta diretamente a relação das empresas com o setor público. A proibição de contratar com a administração pública por até cinco anos pode impedir que empresas infratoras participem de licitações ou contratos públicos, o que representa uma perda significativa de oportunidades econômicas.

Exemplo prático:

Uma construtora que desrespeite as normas ambientais em uma grande obra pública pode ser impedida de contratar com a administração pública por até cinco anos, perdendo acesso a contratos que representem uma parcela significativa de sua receita.

Vale destacar que o art. 79 do Decreto também sofreu uma modificação crucial. Enquanto anteriormente as multas para o descumprimento de sanções restritivas de direito variavam entre R$ 10.000,00 a R$ 1.000.000,00, a nova redação do Decreto nº 12.189/2024 aumentou substancialmente esse limite, fixando as multas entre R$ 10.000,00 e R$ 10.000.000,00. Este aumento, que eleva em dez vezes o teto das penalidades, reflete o endurecimento da legislação ambiental em garantir o cumprimento das sanções impostas, ampliando a responsabilidade financeira dos infratores que descumprirem as decisões administrativas.

Além do aumento das penalidades previstas no art. 79, é fundamental que as sanções impostas pelos órgãos ambientais sejam conduzidas de forma rigorosa e dentro dos limites legais, como demonstrado em recente jurisprudência do TRF da 5ª Região (AC 08018440220184058000, Rel. Des. Fed. Bruno Leonardo Camara Carra, julgado em 14/12/2021). Neste caso, o Tribunal desconstituiu um auto de infração e um termo de suspensão lavrados pelo IBAMA, uma vez que as sanções estavam fundamentadas em um termo de embargo previamente anulado por decisão administrativa ex officio. A decisão reforça a importância de que os atos administrativos que impõem sanções sejam formalmente válidos e isentos de vícios, sob pena de nulidade, o que demonstra a complexidade da aplicação das multas previstas no art. 79.

Aplicação da Jurisprudência na Interpretação do Art. 20

A jurisprudência já vinha lidando com questões relativas à aplicação de sanções restritivas de direito antes mesmo das mudanças introduzidas pelo Decreto nº 12.189/2024. No contexto do art. 20, duas decisões dos Tribunais Regionais Federais se destacam pela análise detalhada da legalidade e razoabilidade da aplicação de sanções como a suspensão de registros e licenças em casos de infrações ambientais.

1. TRF-1ª Região – Processo nº 00208020820114013900 – Rel. Des. Kassio Nunes Marques – Julgado em 20/02/2017

Neste caso, o Tribunal da 1ª Região enfrentou a questão da restrição de direitos imposta pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) em decorrência de infrações ambientais. O relator, Desembargador Kassio Nunes Marques, confirmou a legalidade da medida adotada pelo IBAMA, que suspendeu o acesso ao Sistema DOF (Documento de Origem Florestal) devido à prática reiterada de infrações e o forte potencial de perpetuação das ilicitudes.

O Tribunal entendeu que a suspensão de registro, licença ou autorização, prevista no art. 72, XI, da Lei 9.605/98, deve ser considerada uma sanção autônoma e aplicada em caráter excepcional, sempre fundamentada por elementos fáticos de maior gravidade, como ocorreu no caso concreto. A decisão reforçou que, ao tratar-se de medida drástica, que interfere diretamente na liberdade do exercício de atividade econômica, deve ser justificada por um potencial risco de continuidade das práticas ilícitas, como ficou comprovado na hipótese.

A razão de ser da sanção residiu nos indícios concretos de falsificação de informações no sistema oficial e nas operações enganosas, demonstrando um comportamento contumaz do infrator. O tribunal concluiu pela legalidade da sanção imposta pelo IBAMA, com base no princípio da razoabilidade e proporcionalidade, desprovendo a apelação interposta pelo infrator.

2. TRF-3ª Região – AC nº 0000051-27.2011.4.03.6007 – Relª Desª Fed. Monica Autran Machado Nobre – Publicação em 24/06/2022

Em outro julgamento relevante, a 4ª Turma do TRF da 3ª Região tratou de um recurso relacionado à suspensão do Registro Geral de Pesca, com fundamento nas diversas autuações ambientais sofridas pelo autor. O caso envolvia o cancelamento de licenças por infrações ao art. 34 e art. 70 da Lei 9.605/98, que regulam infrações contra a fauna e a pesca em locais ou períodos proibidos.

O autor alegava que o cancelamento de seu registro fora indevido, já que ele ainda respondia a processo penal e não havia sentença condenatória definitiva. Contudo, a decisão relatada pela Desembargadora Federal Monica Autran Machado Nobre afastou essa alegação, confirmando a legalidade do cancelamento do registro. A decisão destacou que, em casos de reiteradas autuações ambientais, a sanção de suspensão de registro, licença ou autorização, prevista no art. 72, XI da Lei 9.605/98, é aplicável mesmo sem a necessidade de trânsito em julgado da sentença penal.

Além disso, a relatora mencionou que a Instrução Normativa nº 06/2010, do Ministério da Pesca e Aquicultura, autorizava a suspensão ou cancelamento do registro sempre que o órgão fiscalizador competente — no caso, a Polícia Militar Ambiental do Mato Grosso do Sul — solicitasse tal medida. O Tribunal, portanto, manteve a decisão administrativa de suspensão do registro do apelante, confirmando que o ato administrativo impugnado seguia todas as exigências legais.

Interpretação sob a Perspectiva do Decreto nº 12.189/2024

As decisões judiciais citadas demonstram que, para as infrações ambientais, as sanções restritivas de direito, como a suspensão e o cancelamento de registros, licenças e autorizações, têm sido aplicadas de maneira firme pelos tribunais, com base nos artigos 70 e 72 da Lei 9.605/98. O Decreto nº 12.189/2024 reforça ainda mais essa linha jurisprudencial, ao ampliar os prazos de aplicação dessas sanções, prevendo suspensões de até dez anos para os casos mais graves.

A jurisprudência também tem consolidado a ideia de que essas sanções devem ser aplicadas de forma proporcional e justificada, especialmente em casos de infrações reiteradas ou quando há risco de continuidade das práticas ilícitas. As decisões dos tribunais superiores indicam que o rigor das sanções encontra fundamento na necessidade de proteger o meio ambiente e impedir que infratores recorrentes se beneficiem da impunidade.

Dessa forma, as alterações do art. 20 promovidas pelo Decreto nº 12.189/2024 encontram sólido respaldo nas jurisprudências citadas, reforçando a importância da responsabilização ambiental e o papel das sanções restritivas de direito como ferramentas eficazes de dissuasão e correção de condutas nocivas ao meio ambiente.

Conclusão

As alterações no art. 20 do Decreto nº 6.514/2008, trazidas pelo Decreto nº 12.189/2024, impõem um regime de sanções mais severo, com prazos de até dez anos para a suspensão de atividades e licenças. Ao mesmo tempo, a inclusão de mecanismos de revisão das sanções para infratores que regularizem suas condutas proporciona um incentivo para que as empresas e produtores se adequem às normas ambientais de forma mais rápida.

Essas mudanças reforçam o compromisso do Estado em garantir que as infrações ambientais sejam punidas de forma proporcional à sua gravidade, ao mesmo tempo que promovem a correção de práticas irregulares, visando um equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a proteção do meio ambiente.

Flávio Monteiro Napoleão

Advogado OAB/PI 9.068

www.napoleao.adv.br

Referências Bibliográficas

1. Brasil. Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. Dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 jul. 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6514.htm. Acesso em: 24 set. 2024.

2. Brasil. Decreto nº 12.189, de 20 de setembro de 2024. Altera o Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 set. 2024. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2024/Decreto/D12189.htm. Acesso em: 24 set. 2024.

3. Brasil. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 fev. 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9605.htm. Acesso em: 24 set. 2024.

4. TRF-1ª R. Processo nº 00208020820114013900. Rel. Des. Kassio Nunes Marques. Julgamento em 20 de fevereiro de 2017.

5. TRF-3ª R. Ação Cível nº 0000051-27.2011.4.03.6007. Relª Desª Fed. Monica Autran Machado Nobre. Publicação em 24 de junho de 2022.

6. TRF-5ª R. Ação Cível nº 08018440220184058000. Rel. Des. Fed. Conv. Bruno Leonardo Camara Carra. Julgamento em 14 de dezembro de 2021.

7. Brasil. Instrução Normativa nº 06, de 06 de abril de 2010. Dispõe sobre o Registro Geral de Pesca (RGP) e os procedimentos para concessão de autorização para a atividade de pesca. Ministério da Pesca e Aquicultura. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 abr. 2010. Disponível em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/instrucao-normativa-n-6-de-6-de-abril-de-2010-126554122. Acesso em: 24 set. 2024.

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